quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Ninguém disse que era para sempre

Na minha ausência distante e meio perdida
Criaste uma âncora pesada
E quando na luz da lua me vias à noite
Eu via também o teu conforto mortal

Na mesma maré que te cheguei aos braços
Fui sentindo o vento do destino a afastar-nos
Em doces golpes sem misericórdia
Que me apagaram o resto da alma

Trazias todos os desejos do mundo dentro de ti
Mas transformaste-os em frustrações alucinantes
Como se o fim fosse amanhã
E talvez fosse mesmo

Doeu guardar-te na gaveta empoeirada
Mais ainda me doeu enterrar-te
Sem sentir a reconquista que ansiava
Que o egoísmo não deixou mais existir

Porque no final eras apenas tu
Miserável aconchego de uma vida
Que a solidão ouviu chorar e pensou:
Ninguém disse que era para sempre

sábado, 29 de março de 2014

Desassossego

Renasci frágil por entre a terra dura que me cobria
Senti o sol preencher-me o rosto e as minhas raízes a espalharem-se
Cresci em cada dia que passava e tornava-me mais forte

Recordei-me de quando ainda não via
Nem conseguia saborear o simples prazer da vida
Chorei por dentro, nunca por fora

Depois da sombra que me preenchia ser ter desvanecido
Não porque eu quis, mas porque existe algo mais
Veio a paz de espírito, veio a luz, a luz

E continuo desde então a pensar com algum desassossego
Que os tempos mudam e as pessoas mudam efectivamente
Mas não quer dizer que seja para melhor

sábado, 8 de março de 2014

De volta à vida

Se eu um dia chegar a entender o porquê da felicidade
e o porquê do amor
farei com que toda a gente o saiba
e irei partilhá-lo com o resto do mundo.
Levarei comigo os melhores poetas
imaginarei os melhores cenários.
Zela por mim, eu zelarei por ti.

sábado, 22 de junho de 2013

O último balancé



Voei  entre as amarras que me prendiam ao infinito da minha inocência
Sentado na madeira moldada pelas mãos de ouro
Que sabiam mais que o mundo.
Era o meu balancé, o melhor balancé já alguma vez feito.
Passava as minhas tardes a voar, para a frente e depois para trás
E assim sucessivamente.
Apenas balançando num movimento repetitivo, não havia nada em que pensar
Havia apenas que voar.
Depois desse não houve mais nenhum, a madeira do balancé apodreceu com o tempo
E com ele surgiu o pensamento e amadureceu a essência do meu ser.
Não me fizeste mais nenhum balancé.
Não porque não quisesses, mas porque não podias.
As mãos de ouro que moldaram a madeira, estavam agora sem movimento.
No entanto, nunca perderam o brilho, a delicadeza e o valor.
O último melhor balancé do mundo foi meu.
Obrigado avô.


sábado, 6 de abril de 2013

Assim

E assim, tal como tudo começou
Tudo vai permanecer na indiferença, que é a que mais destrói.
Da cegueira que me inundou e quase afogou
Ao desprezo que agora sinto.
A pequena chama que ardia em mim tímida mas furiosa
E que agora se apagou.

Serei mais um até ao infinito 
Nesse teu universo obscuro de números
Que contas e guardas orgulhosamente na algibeira.
Serás tu e eu também
Felizes
Assim.



domingo, 20 de janeiro de 2013

Longa história curta

Ele esperava incessantemente por uma paz interior que teimava em chegar
Quando finalmente atingiu o seu objectivo, percebeu que estava bem
Todas as horas seriam assim e prometeu a si mesmo ser feliz
As horas passaram, depois os dias, depois as semanas
Ao longo de todo esse tempo era como se fosse outra pessoa
Sentia que se tinha transformado em algo tão puro como ele mesmo
Tão verdadeiro e honesto como a própria vida
Soube lidar com a dor e com a guerra interior que ainda hoje o atormentam
Mas continuava a não entender o porquê

O porquê de se sentir bem quando achava que devia sentir-se mal.


domingo, 23 de dezembro de 2012

3x9

A minha inteligência que me persegue não me acompanha no caminho inverso ao que fiz até agora.
A minha visão do mundo está tão perversa como eu próprio sou todos os dias que me lembro.
Não há razão de ser para o que eu digo, para o que eu digo, para o que eu digo...
Há uma vontade de girar e ficar no mesmo sítio, assim como estou agora, a girar.

O mundo gira, eu também, com a excepção de que eu não viajo pela agradável escuridão que me ilumina de vez em quando.
Aceno ao longe, aceno ao desejo e à paixão e num golpe de etilismo faço-me à estrada.
Tomo o caminho que qualquer coisa deve tomar. A verdade tão nua que me dói só de pensar no seu oposto.
A verdade que me salvou, que me guiou, mata-me com um sopro tão simples como uma suave brisa de um temporal longínquo, daqueles de que se ouve falar mas que não nos dói mas que dá que pensar.
Um palavrão, dois palavrões...não mais. Foi isso o que a verdade me trouxe, num alívio dolorosamente dormente pelo sopro que me bateu.

Há um momento entre mim e uma qualquer coisa que me excita loucamente. Há um espaço que me impede de concretizar tudo o que o mundo me deve, há.
Não.
Não.