quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O grão de areia #2

Um dia o grão de areia, imóvel na escuridão do fundo do mar, no meio de tantos grãos de areia, mas sentido-se sozinho porque não podia falar, sentiu-se estremecer, nunca sentira tal coisa, os grãos de areia debaixo dele estremeciam, até que se sentiu mover, foi algo estranho, porque nem quando era arrastado pelas correntes sentia tal sensação. Rebolou e rebolou e voltou a rebolar, batendo contra os outros milhões de grãos de areia, até que parou, mas era estranho porque sentia que estava em movimento. Repentinamente sentiu um vazio imenso, tinha a certeza que nunca tinha experimentado tal sensação, estava a cair a uma velocidade que nunca tinha caído. Sentia-se pesado.

Após a queda, para seu azar, ficou mais uma vez enterrado no meio de outros milhões de grãos de areia. Estava escuro. Ouvia uns barulhos estranhos, uns ruídos semelhantes ao que alguns peixes faziam. Tentou ouvir com atenção e perceber o que era, mas nada feito. Então ali ficou umas horas, uns dias sempre no meio da escuridão no meio de tantos outros grãos de areia, com a desvantagem que agora não ouvia as conversas dos peixes.

Suspirou de tristeza. Sabia que o esperariam muitos dias de escuridão sem nada ouvir, nem ver. Se ao menos pudesse falar, mas como se sabe, os grãos de areia não falam, sempre ouvira os peixes dizer que os grãos de areia não falavam.

Continua

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O grão de areia

Era uma vez um grão de areia, igual a tantos outros grãos de areia, que vivia no fundo do mar. Tinha a sorte de estar à superfície e não estar debaixo de outros milhões de grãos de areia, mas apesar de estar à superfície, não podia ver nada porque tudo era escuro. Por vezes as correntes marítimas ou peixes que passavam por ele azafamados, faziam com que ele se movesse, e enquanto se movia uns centímetros acima dos outros grãos de areia, sentia-se flutuar com uma liberdade imensa mas sempre dentro da densa escuridão que o oprimia.

O grão de areia não falava, porque os grãos de areia não falam, mas tinha ouvido conversas de uns peixes que diziam que lá em cima, umas barbatanadas mais acima, onde terminava o ar e começava a falta dele, que havia muita luz, luz forte que iluminava por longas barbatanadas. Os peixes tinham dito que haviam peixes com escamas estranhas, vindos de onde não havia ar e que por vezes mergulhavam com uma velocidade impressionante para comer outros peixes. Tinham bicos compridos em vez de boca e umas barbatanas enormes, uma de cada lado. Além de duas coisas estranhas que mais pareciam paus que abanavam debaixo do corpo. O grão de areia achou estranha a descrição dessas criaturas, peixes que pairavam onde não havia ar…pfff…pensou ele.

A rotina do grão de areia era monótona e apesar de estar rodeado por outros grãos de areia, não podiam falar nem se podiam mover. O passatempo favorito era ouvir as conversas dos peixes ou ser arrastado pelas correntes, era a única altura em que se sentia livre e podia voar como os peixes. Batia em rochas enormes, algas e até peixes, mas estes não gostavam muito, diziam que lhes faziam cócegas. Sempre que os grãos de areia eram arrastados mudavam de sitio e nem sempre os sítios onde ficavam eram bons. O grão de areia já tinha ficado muitas vezes enterrado, imobilizado debaixo de outros grãos de areia e sentia pena dos outros que ainda estavam mais fundo que ele, porque assim nem as conversas dos peixes eles podiam ouvir.


Continua.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Queres ver

Cenário: Almoço de família (agora mesmo vá)

Pai: Então o Renato declarou-se inocente?
Eu: Isso deve ter sido o advogado que o aconselhou.
Pai: Queres ver que o velho caiu em cima do saca rolhas...!?